Arenales – Final push (Parte 3 de 3)

^ Cajón de Los Arenales.

No sábado, o tempo firmou de vez, mas de longe ainda era visível várias “tiras” de água nas paredes e muita neve nas partes mais alta. Assim, resolvemos encarar uma escalada mais baixa, por uma via que já estava seca, a via “Mujeres, tequila y otras yerbas” na Agulha Nuez. Mesmo sendo desaconselhado por muita gente acabamos entrando na via, maioria das pessoas falava que a via não era bonita. Mas o interessante é que essa linha se destaca na paisagem da região é uma escalada muito sugestiva e natural, o que chama a atenção.

Tirando o fato de termos pegado muito transito na via, achamos ela legal. É claro que não se compara com a via “Alquimista”, por exemplo, mas ainda assim, é uma via muito honesta e natural.

Atualmente, a área de Arenales possui 2 guias impressos. Um guia de 2004 e outro de 2014. Teoricamente o mais novo era para ser mais atual e com menos erros do que o de 04, mas pelo que andamos vendo não é bem assim. Na verdade, ter dois guias nos deixava mais confuso do que claro. A via “Mujeres, tequila y otras yerbas”, por exemplo, no guia antigo, diz que a via acaba num ante-cume (P3) e no novo que ela acaba num outro ante-cume (P4) mais acima.

Croqui da via “Mujeres, tequilas y otras yerbas”. Oficialmente a via acaba na P3, mas vale a pena tocar mais uma enfiada pelo 6a para chegar num outro cume.
Resquícios da nevasca.
Selfie.

No domingo, resolvemos entrar numa das paredes mais icônicas do cajón e um dos objeto de desejo dessa trip, a Agulha Cochete! Para os olhos de um escalador, essa agulha é o que mais chama a atenção pela sua imponência e extensão em todo o vale.

Escolhemos a clássica via “Mejor no hablar de ciertas cosas” com algumas variações no meio para pegar as melhores fendas. Como a via tem aproximadamente 500m de extensão, dessa vez tivemos que acordar mais cedo para garantir a escalada com segurança. E também para ganhar tempo, ainda esticamos à francesa as primeiras 4 enfiadas da via por uma canaleta bem decomposta.

Mais uma vez, pegamos um pouco de trânsito na via, mas nada que tenha nos comprometido. Como já estávamos mais adaptados ao estilo e ao frio da região, a escalada transcorreu sem maiores problemas e chegamos no cume da agulha por volta das 17 horas, após 7 horas de escalada.

Croqui da via “Mejor no hablar…” Entre as enfiadas 5 e 9 há diversas variantes. Conforme o gosto e estilo do cliente.
Sandro no último “largo” da Agulha Cochete.
Quase lá… Ao fundo, o acampamento.
Pode descer tranquilo!

Depois de uma semana de montanha, mais uma escalada de 500m, estávamos precisando de um outro dia de descanso, e assim o fizemos na 2ª feira.

Dia de descanso, dia de tomar sol!
E fotografar a fauna local.
O arco do refúgio.
Hora da janta.
Estudar sempre! Seja onde for!

Na terça-feira, resolvemos encarar a temida aproximação da Agulha Charles Webis para escalar a via “Ya te guaverigua ” e fazer cume remendando outras vias. Como já estávamos mais aclimatados, sofremos menos com a aproximação (2h), mas ainda assim sofremos com a cascalheira. Nesse dia, estranhamento, o dia amanheceu mais frio do que a média, e mesmo chegando cedo na base da via, tivemos que ficar esperando mais de uma hora até que o sol batesse na via. Mesmo não sendo uma via longa, essa escalada demandou bastante tempo devido à dificuldade técnica e aliado ao fato de termos entrado tarde na via dia, acabamos chegando um pouco tarde no cume. Por isso, no final, tivemos que dar uma agilizada para garantir luz na descida.

Sandro na enfiada-chave da Charles Webis.
Alemão Roni na Agulha Charles Webis.

Na 4ª feira, voltamos novamente ao “conjunto”, mas dessa vez para fazer a Agulha Campanile pela variante “Armonica”. Mais uma vez fomos desaconselhados a fazer essa via pelos escaladores que estavam na região, mas mesmo assim entramos nela, pois estávamos ali para escalar, seja uma via ruim ou boa.

Como de praxe, deixamos todos os equipos escondidos na base da via no dia anterior e assim subimos muito leve no dia seguinte.

A via em si é muito tranquila e agradável. Uma escalada de puro desfrute. E o melhor de tudo é que a via sempre oferece uma linha mais dura ao lado de uma passagem mais fácil, tornando a escalada bem democrática.

Pela primeira vez em duas semanas, finalmente fizemos uma via tranquila e de puro desfrute, o que foi muito importante para nós, pois já estávamos bem cansados e , além disso, essa seria a nossa 7a e  última agulha da trip.

Hoje fico pensando se a via foi de fato puro desfruto ou era nós que estávamos nos acostumando com a escalada da região…

Desfrute na Variante Armonica, Agulha Campanille.
Vista do cume.
Sandro no cume da Ag. Campanille.

Na 5ª feira, último dia de escalada, resolvemos pegar leve. Os nossos pés estavam mais cansados do que as mãos, então achamos por bem pegar leve para não acabar nos machucando de bobeira na saideira. Decidimos encarar os “monolargos” de Agulha Carlos Daniel para fechar a trip. Esse é um pequeno setor de escalada que fica aos pés dessa agulha, e como o nome sugere, têm várias vias de 1 enfiada em móvel.

Nos aquecemos num 5º SUP e depois encaramos um 7b (BRA) de dedo chamado “Deditos finos”. Sob condições normais, um 7b (BRA) é uma dificuldade que uso para aquecimento em vias esportivas. Mas quando se trata de fenda, as coisas não funcionam bem desse jeito. Na entrada à flash, sacando as peças, não consegui achar os pontos corretos para proteger e acabei caindo. Tive que, além de entender os movimentos, descobrir os melhores pontos para proteger a via. O pior de tudo era que as melhores colocações eram, ou nas agarras de mão ou pé…

Na segunda entrada errei a ordem das peças e acabei protegendo o crux com o Camalot errado (#.3) que ficou “daquele jeito” mas mesmo assim persisti e logo depois acabei caindo porque o meu pé direito escorregou “no nada”. Por sorte, mesmo mal colocado, a peça aguentou a queda. Na terceira entrada, dessa vez com a ordem das peças corretas, finalmente consegui mandar sacando “sem maiores dificuldades”…

Depois de duas semanas de muito aprendizado, a última escalada foi um banho de água fria na minha moral e dignidade. E pensar que há semanas atrás tinha mandando um nono grau em Calogi, mostrou quanto a escalada é polivalente e como cada “jogo” pode ser totalmente diferente. Talvez por isso mesmo que adoro tanto esse negócio de subir pedra.

Na 6ª feira, às 9h em ponto, no mesmo estacionamento onde fomos largados há duas semanas, a van surrada do Yagua veio nos buscar para nos levar de volta à “civilização” e a um merecido banho quente após duas semanas à seco!

Dormitório do refúgio.
Assim acaba mais mais uma trip.
Rio Los Arenales.
Entardencer no cajón.
Bucólica Los Arenales.

Da minha parte posso dizer que foi uma trip muito boa onde, mais uma vez, aprendi muito sobre o mundo, a escalada e mais sobre mim mesmo. Tive a sensação de que a trip fora um pouco curta demais, na verdade a gente sempre acha isso. Acho que saímos de lá bem na hora que estávamos nos adaptando física e mentalmente ao estilo de escalada da região. Talvez mais uma semana lá fosse o ideal para poder provar vias mais exigentes, coisa que não falta lá. Com certeza, sai de lá com um gostinho de “queria ter escalado mais”, “ainda quero volta lá novamente”, mas ao mesmo tempo sei que as chances de voltar lá serão remotas, pois acho que a vida é curta demais e o mundo grande demais para ficar voltado a um mesmo lugar várias vezes… mas quem sabe…

Sobre as fotos: Para essa trip levei duas câmeras: uma Nikon D600 com três objetivas (20mm, 50mm e 180mm) para usar na área do camping; e uma Fuji X100s que usava basicamente durante as escaladas. Além disso, carreguei um tripé Befree Manfrotto para cima…

Por fim, gostaria de agradecer a parceria e boa vibe do Sandro nessas duas semanas na montanha, onde se mostrou um excelente cozinheiro de Liofood; e a todas as pessoas com as quais convivi naquele pequeno paraíso da escalada tradicional. E também a minha esposa Paula que me deixou ficar duas semanas sem dar notícias.

Em breve pretendo escrever um artigo com todos os betas sobre as escaladas na região do Cajón. 

Para ler o pequeno Guia de Escalada de Cajón de Los Arenales, clique aqui!

Olha, sem as mãos…. Cume do Campanile. Foto: Sandro

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