East Buttress do El Capitan, a escalada final

El Capitan!

Após a escalada da via Kor Beck tínhamos apenas mais um dia de escalada antes de voltar para o Brasil. Para o gran finale reservamos a via East Buttress (5.10, 450m) do El Capitan para fechar a trip com chave-de-ouro.

Como estávamos bastante exauridos pelo cansaço acumulado, no dia seguinte, resolvemos fazer um descanso de verdade. Nada de fazer boulder, escalar via curta, rodar 120km para ver sequoias ou fazer compras em Marmmoth. Descanso de verdade! Para não dizer que não fizemos nada, lavamos algumas roupas sujas e tomamos um banho decente. No mais ficamos quietinhos no Camp 4.

Na 5o feira, último dia de escalada, acordamos mais cedo do que de praxe, às 4h. Tomamos um café amargo que insistiu em não descer bem pelo nervosismo que estava no ar e partimos para a aproximação.

Há quem diga que a East Buttress não faça parte do El Capitan, embora ela fique no canto direito do El Capitan. A East Buttress é a única via em livre acessível a meros mortais que pode ser escalado em apenas um dia de escalada. Todas as outras vias do El Capitan são escaladas em estilo big wall, onde é preciso passar pelo menos umas 5 noites na parede para completar a escalada.

A aproximação inicial tem uma pequena caminhada de 1h para vencer um desnível de aproximadamente 300m por um grande grande desmoronamento de pedra até conseguir tocar na pedra em si. Assim que consegui tocar no El Capitan de verdade pela primeira vez, pedi benção, olhei para cima e engoli seco ao ver a verticalidade da pedra.

Para a nossa sorte, a via começa numa parte menos inclinada, mas ainda assim bem intimidadora. Ainda sob a luz do headlamp comecei a escalada por um longo e extenuante chaminé de uns 50m. A medida que ia progredindo, fui percebendo que tinha que fazer cada vez mais força com os braços, até chegar num ponto em que notei que estava escalando em um trecho negativo!!! Meu Deus, respira fundo, soca mais peças na fenda e toca para cima logo!!!!

Cheguei assustado na P1. Não estava esperando isso. Era para ser mais fácil! Olhei para os lances iniciais da próxima enfiada, a enfiada crux de 5.10, e dei graças a Deus por não ser a minha, porque a coisa parecia bem encardida.

Murilo chegou na P1, olhou para a próxima enfiada, olhou para mim e fiz uma cara de “sim tu tá fudido”!

Entrou na enfiada chave, colocou algumas peças e pela primeira vez na viagem vi ele passar mal no lance e achei que ele realmente fosse cair, mas de alguma forma conseguiu passar o lance mais crítico e sumiu atrás de um diedro.

Nesse instante, apareceu uma dupla feminina na base e elas começaram a mesma via que nós estávamos travando uma batalha épica. Na enfiada da chaminé que eu passei veneno, ela passou com uma facilidade fora do comum. Esboçou um esforço desprezível no trecho final em negativo e chegou achando graça do crux final… Ah, se soubesse que eu tive que dar um grito para dominar o platô final…

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Escaladora na 8a enfiada da East Buttress do El Capitan.

Continuamos tocando pedra à cima. Na quarta enfiada, o croqui dizia RUNOUT, mas não dei muita bola. Só fui dar conta do verdadeiro significado quando olhei para cima e vi uma face cheia de knobs de uns 20m sem nenhuma fenda. Pelo primeira vez na minha vida, escalei sem olhar para baixo. Não queria ver aquela corda presa em mim ir direto para o freio do Murilo lá embaixo sem passar por nada.

Refeito o susto chegamos num lugar tranquilo de onde foi possível ver a seção superior da via. Olhei para cima e não era nada do que estava esperando. A pedra era mais vertical do que o esperado, tenha muito menos fenda do que o esperado e para piorar, vários trechos de rocha instável.

O desgaste mental de 3 semanas de escalada estava cobrando o seu preço. Estava me sentindo cansado mentalmente de tanto perrengue. E para piorar, o dia amanheceu muito estranho. Estava ventando forte de um quadrante que não era comum e as nuvens estavam com uma cara mais feia. Estava claro que o tempo iria virar. Era só uma questão tempo. Eu sabia que uma virada de tempo ali seria roubada na certa. Se não bastasse a pressão da via, ainda tinha esse tempo estranho nos obrigando a ter que escalar mais rápido.

Tocamos mais algumas enfiadas, passando aperto em todas as enfiadas. Lances negativos, trechos mal protegidos, escalada técnica e tudo mais. E a pedra ali imponente, sem dar arrego.

Somente na última enfiada a pedra perdeu um pouco de inclinação e conseguimos escalar mais tranquilamente. E após 10h de escalada, finalmente chegamos no cume do tão sonhado El Capitan!!!

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Escaladora na última enfiada da East Buttress com o Half Dome ao fundo e o tempo virando rapidamente.

Como o tempo estava deteriorando cada vez, matamos um sanduíche rapidamente e fomos procurar a descida.

E assim fechamos a nossa trip pelo vale dos sonhos. Foram 3 semanas de escalada, 118 enfiadas, mais de 3000m escalados, várias fatias de pizza, litros de cerveja e acima de tudo muito aprendizado.

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Sequoias gigantes em Mariposa Grove.

Agradecimento especial ao Murilo que dividiu a ponta da corda comigo nessas 3 semanas e a outra dupla Brasa, Sandro e Zé Márcio, que também dividiu a vivência na montanha e a experiência do dia-a-dia pelo parque.

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Contemplando as muralhas de pedra.

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Little Yosemite ao amanhecer.

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Árvore.

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High Sierra num dia de muito fog.

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Esquilo ladrão de comida de Yosemite.

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Mais um dia que se vai no vale.

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Noite estrelada visto do Camp 4.

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