^ Pedra do Túnel com seus dois túneis na base.
Entre as diversas facetas da escalada, uma em especial sempre me fascinou muito, a escalada solitária. Desde o dia que comecei a escalar já cai nos encantos deste estilo de escalada. Cresci ouvindo histórias do escalador João Giacchin conquistando em solitária os conglomerados de Caçapava do Sul e lendo os relatos do alemão Alex Huber pelos Alpes austríacos.
De vez em quando gosto de visitar essa faceta e escalar uma montanha no “mano a mano”! Somente eu e a montanha. No último domingo me aventurei por uma via recentemente concluída pelos escaladores Fred, Tesourinho, Joyce, Luana e André Alves na Pedra do Túnel em Ibiraçu. A via se chama “Locomotiva 269” e tem 4 enfiadas, totalizando aproximadamente 200m de extensão.
Conforme a dica dos conquistadores, a melhor estratégia para entrar nessa via é começar bem cedo da manhã para pegar a pedra na sombra. Assim, sai de casa às 5h10 da manhã rumo à pedra. Como já andei por aqueles lados, fica em frente a via “Trem Fantasma”, a ida foi bem tranquila e em pouco mais de 1h já estava estacionando o carro na entrada do túnel para começar a caminhada. A caminhada foi relativamente tranquila, tirando o pasto final molhado e íngreme…
Quando se escala em solitária, há alguns detalhes técnicos que na escalada em dupla passam desapercebidos, como por exemplo a ancoragem na base da via. Como a corda precisa ficar presa no início de cada enfiada para servir de ancoragem é preciso montar um esquema “bomba”. Normalmente se faz isso com a parada, mas como na base nunca tem parada, isso sempre é uma preocupação. E nessa via em particular, tive um pouco de dúvida quanto a isso. Por sorte, bem na base da via tinha um pequeno arbusto da circunferência do meu ante-braço e ele acabou sendo a minha ancoragem bomba para começar a escalada.
Para fazer a minha “auto-seguro”, atualmente estou usando o Silent Partner. Antes usava o Soloist, mas para o tipo de terreno do ES esse esquema não é o mais seguro, por isso tive que migrar para o trambolho do SP.
A primeira enfiada é o crux da via. Ouvi relatos de que a via era vertical e tal, mas na verdade é uma rampa íngreme com muitas agarras boas, o que para mim foi muito bom, pois facilitou o trabalho. Já o crux é um pequeno boulder de reglete com virada em abaulado bem protegido. Quem estiver acostumado com boulder, vai tirar de letra a passada.
A segunda enfiada também é para ser o crux da via. Diferentemente da primeira, a segunda já tem um trecho “verdadeiramente” vertical, mas ainda com muitas agarras boas que acabam salvando. Embora os dois crux’s sejam graduados em 6o SUP, achei esse bem mais fácil (5o SUP). Contornando pela direita e usando umas invertidas ficou facinho! Fica a dica.
Dali para cima foi correr para o abraço. Na terceira enfiada, a pedra perde inclinação e tudo ficou mais fácil. A essa altura do dia, o sol começou a me incomodar, mas como ventava com muita força acabou mascarando o queimado… Na verdade ventava com tanta força que fiquei preocupado com a corda na hora do rapel.
A 4a enfiada é só um protocolo para chegar no cume, que por sinal é bem bonito e com uma bela vista da Pedra do Mosteiro.
Segundo os meus cálculos, fechei a via em 3h de escalada, mais uns 20 minutos procurando o maldito livro de cume. Não sei porque cismei que ele estava embaixo de uma árvore e fiquei um bom tempo procurando e chingando os conquistadores… Na verdade ele estava à esquerda, embaixo de uma pilha de pedras.
A descida foi bem tranquila, mesmo com o vento forte, a corda não prendeu em nada e desci sem problemas. Como uso uma corda de 10mm emendada com um cordelete de 7mm, qualquer problema na descida pode se tornar um grande problema, então sempre rola um certo grau de nervosismo.
Sobre a via, posso dizer que é uma excelente opção para quem busca uma via tradicional de meio turno nas proximidades da grande Vitória. O único ponto de atenção é entrar cedo na via para não torrar ao sol. Pelo que vi, essa é uma via que fica mais tempo na sombra durante o verão e no inverno acho que pega sol direto.
Parabéns aos conquistadores pela via. Acharam um filé com agarras e buraco no Espírito Santo! Isso é difícil!