Agosto de 2014
Acordamos cedo em Itarana, DuNada, Afeto e eu, no Pesque-pague de Praça Oito. Após uma noite, mais do que merecida de sono, partimos rumo ao distrito de Santa Joana para conquistar uma via na região.
Fizemos a aproximação, conversamos com o Sr. Sérgio, dono das terras que nos levou até a pedra, e quando chegamos na base, achamos um saco plástico jogado no chão. Dentro dele, uma dezena de chapeletas. Incrédulos, olhamos para cima e logo visualizamos pelo menos 2 chapeletas, exatamente na linha que estávamos almejando.
Alguns telefonemas e logo descobrimos que a linha tinha sido começado pelo Zudivan a alguns meses atrás.
Sem muita opção, demos meia-volta e fomos conquistar o cume principal do Garrafão de Santa Maria de Jetibá.
Tudo isso está neste post!
1 de Setembro de 2018
Depois que voltamos de lá, o Zudivan prontamente se prontificou a nos colocar na próxima empreitada para concluir a conquista do Pontal de Santa Joana, mas o tempo passou e nunca conseguimos encaixar o nosso calendário. Até que no último sábado, finalmente conseguimos conciliar a agenda e voltar à pedra para dar fim a uma dívida de 4 anos.
No sábado, dia 1o de setembro, Afeto e eu partimos de Vitória às 5h da manhã e nos encontramos com o Zudivan, Sr. Prof. Brunoro e Johny no trevo de Santa Joana para dar sequência à conquista da face sudeste do Pontal de Santa Joana.
O pedido
Voltamos às terras do Sr. Sérgio e nos reencontramos após 4 anos. Assim que nos viu, ele soltou:
– Opaaaaa, vocês voltaram!
São as desvantagens de ter um jipe branco com um japonês dentro…
Um pouco antes, conhecemos o irmão do Sérgio, um senhor que esqueci de perguntar o nome. Cordialmente conversamos um pouco com ele e falamos das nossas intenções nas terras dele. Quando falamos que nós queríamos subir a pedra, ele falou que quando o pai dele completou 60 anos, ele pediu aos filhos que o levassem ao cume da montanha para colocar um cruzeiro de madeira.
E completou:
– Se vocês vão lá, vou pedir que arrumem o cruzeiro, pois com o tempo ele acabou caindo. E hoje, eu já não tenho mais idade para voltar lá para arruma-lo.
Aquela frase nos soou como um pedido mais do que especial e deu para ver nos olhos daquele senhor de olhos cansados, o quão importante era aquilo.
Nos despedimos com a promessa de que iríamos arrumar o cruzeiro a partimos para pedra.
Chegamos na base da pedra um pouco atrasados, umas 10h. Infelizmente durante a ida, nos deparamos com um acidente em Cavalinhos, onde um carro perdeu o controle na entrada da curva e acabou rodando sobre a ponte com todas as rodas destruídas. Como fomos o primeiro carro a passar depois do acidente, paramos para dar uma ajuda e sinalizar o local a fim de evitar um segundo acidente.
A minha primeira “re-visão” daquela montanha foi um pouco preocupante. Na memória visual, a montanha era mais fácil, menos inclinada, mas assim que me encordei e senti a verticalidade, percebi na hora que eu tinha subjugado a montanha. Para dar um tempero extra, os cristais que de longe abundavam na face da montanha, logo se mostraram pouco amigáveis. Eram apenas quantidade e não qualidade.
Toquei a via a partir da P2 da via original que o Zudi tinha começado. Na época da conquista, eles vieram pelo outro lado da montanha, conquistando 2 enfiadas até o colo, mas dessa vez, acessamos diretamente o colo da montanha pelo outro lado e ganhamos 2 enfiadas para poupar tempo, do mesmo jeito que fizemos há 4 anos. Logo, a terceira enfiada foi um aperitivo para o que estava por vir. Estiquei 50m até a base do trecho mais vertical da pedra e ali montei a P3 da via.
O Afeto pegou a 4a enfiada conquistando uma enfiada mais curta de 30m pelo trecho mais vertical da pedra e assumi a ponta novamente.
Por volta do meio-dia, iniciei a conquista da quinta enfiada. A essa altura, o sol estava “pocando” com força, mas graças ao nosso trabalho em equipe a conquista estava fluido com rapidez. Afeto e eu subíamos muito leves na frente, abrindo as enfiadas, enquanto o trio vinha logo em seguida fazendo o apoio logístico. Aliás, quando se conquista com Zudivan e companhia, peso nunca foi problema para mim. Pensa num cara que gosta de carregar peso para os outros!
Estiquei toda corda, poupando ao máximo as poucas chapeletas que tínhamos. Tínhamos levado 32 chapeletas e ao final da 5a enfiada, tínhamos apenas 12 chapeletas para chegar no cume.
Por sorte, a próxima enfiada se mostrou menos inclinada, prometendo que o cume estaria por perto. Passamos a corda para o Zudi e falamos:
– Zudi, vai, mas não usa as chapeletas, porque estamos racionando.
Coitado, tocou 60m sem bater nenhuma proteção para poupar chapa…
Depois de um runout de 60m, ele bateu a P6, já quase na virada da pedra. Tudo indicava que na próxima enfiada estaríamos no cume. Peguei a ponta da corda novamente e fui à luta. Como tinha pilhado o Zudi a conquistar a enfiada anterior sem bater chapas, fui na mesma obrigação. Estiquei mais 60m de corda e faltando mais uns 50m de terrenos fácil, bati a parada final por volta das 14h, completando a conquista em pouco menos de 4h de escalada.
Como chegamos no cume cedo, pudemos passar um bom tempo curtindo a vista da região. O Espírito Santo é um Estado privilegiado em termos de montanhas, mas nem todas as montanhas têm um cume limpo, sem vegetação. Chegar num cume careca como o de Pontal de Santa Joana sempre é motivo de alegria extra.
Em geral, quando chego no cume da montanha, chego na “zela”, quase sem água e sem comida, até porque nem levo comida. Mas quando se escala com o Sr. Prof. Brunoro, a história é beeem diferente. Quando começamos a escalada, ele chegou com uma mochila de ataque amarela cheia até a boca e assim ele escalou a montanha inteira. Ninguém escala uma montanha com uma mochila cheia até o cume à toa. Dito e feito, quando chegamos no topo ele tirou um drone e logo depois, um salame italiano, uma barra de cereal, uma paçoca, ovo cozido, um sanduíche, suco, água… E tudo isso para dividir conosco! Que manjar dos Deuses. E para completar, o Afeto ainda levou uma Coca-cola numa garrafa térmica para fechar o almoço no cume com chave-de-ouro.
De barriga cheia, fomos cumprir a nossa promessa de arrumar a cruz que o Sérgio, seu irmão e seu pai levantaram quando ele completou 60 anos. Na minha cabeça era uma cruz pequena, mas quando cheguei mais perto vi que era uma cruz enorme! Peguei o meu prussik, arrumei a cruz e coloquei a de volta conforme prometido. Depois fui tentar ver por onde aquela cruz subiu. Fiquei de cara ao descobrir por onde eles subiram para acessar o cume. Até para quem está acostumado a escalar, aquele costão era bem significativo para subir de bota e sem equipamentos de segurança. Sempre me surpreendo com a coragem dessas pessoas do interior que sobem essas montanhas em nome da fé.
Inclusive, o nome “Engenheiros do Cruzeiro” foi inspirado nessa “missão” que nos foi incumbida. Sinto me feliz e honrado em ter ajudado aquele senhor de idade a reerguer a cruz, pois imagino que aquilo tem um significado muito importante para ele.
Por volta das 15h30, iniciámos a descida. Como acabou sobrando chapeletas, descemos intermediando as últimas duas enfiadas e em menos de uma hora, todos nós já estávamos de volta à base da montanha e dali fomos atrás de um bar para “aquela reidratada especial”.
3 respostas em “Pontal de Santa Joana, uma dívida de 4 anos!”
O ano é 2020 e ninguém mais viu o japones do Jeep Branco.
Um bom dia na montanha, valeu Japa e toda a galera!!!
Valeu japones!
Gostei do Sr. Prof. Brunoro kkkkk