Atenção: post longo!
Trago aqui o relato da viagem que fiz com o Afeto por Itatim e Lençois na Bahia durante as últimas duas semanas.
Só para entender, ao longo da viagem, parei três vezes, durante os dias de descanso, para escrever as impressões: Parte 1, Parte 2 e Parte3.
Parte 1
Mesmo após dois dias de escalada intensa, hoje acordei às 5h da manhã para ver o nascer do sol — que não aconteceu porque amanheceu nublado e chuvoso em Itatim, Bahia. E agora, às 15h, o sono está cobrando seu preço.
Já estamos na cidade de Lençóis, a 4h de carro de Itatim, sentindo todo o poder do sol, jogados no sofá duro da casa que alugamos para passar a semana. O Afeto está estirado no chão, usando os 240 m de corda que trouxemos como travesseiro e “gastando” a internet.

Nossa viagem começou há 3 dias, quando nos encontramos no aeroporto de Salvador, alugamos um carro e rumamos a Itatim, distante 3h da capital.
O destino principal da trip é Lençóis, mas de Salvador a Lençóis a perna seria muito longa, umas 8h; então resolvemos fazer um “stopover” em Itatim para escalar dois dias antes de seguir viagem.
Chegamos no final do dia ao Refúgio Frei, do brother Ismael, conterrâneo que foi parar lá após rodar pelo Brasil e recém-inaugurou um pequeno refúgio.
Como um bom gaúcho, nos aguardou com um belo churrasco à moda gaúcha, com direito a maionese caseira de ovo. Os gaúchos entenderão.

No dia seguinte, o dia amanheceu feio. Uma instabilidade marítima trouxe bastante umidade que, dessa vez, a serra não conseguiu segurar e levou chuva à Caatinga. Nessa época do ano, as primeiras chuvas da estação trazem um pouco de frescor para a região castigada pela seca. A paisagem, antes opaca, começa a ganhar tons verdes, dando uma cor especial.
Essa foi minha segunda ida a Itatim em menos de um mês e a primeira visita do Afeto ao paraíso dos inselbergs baianos.

Jararaca
Com as paredes molhadas, resolvemos passar o domingo no setor de escalada esportiva mais clássico de Itatim: a Jararaca.
O setor é um grande anfiteatro de gnaisse no meio da parede, crivado de vias. Em geral, essas feições geológicas são ou de rocha pobre, ou lisas e sem agarras, mas aqui, nessa única “cueva” de Itatim, há tantas agarras grandes e boas que até os simples mortais podem sentir o gostinho de escalar numa caverna.
Chegamos ao setor sem pressa, pois sabíamos que tínhamos poucas balas no pente. Mesmo sendo acessíveis, a maioria das vias fica na casa do oitavo e o estilo de escalada é bem peculiar, exigindo um certo processo de aprendizado.
Começamos os trabalhos num 7b amigo, mas assim que o Afeto entrou sacando, já na segunda agarra reclamou que elas estavam “babadas”.
Nossa aproximação foi embaixo da água, e ali já deu para sentir que a cueva poderia estar úmida, porque a face da rocha ficava voltada para o spray da chuva.
Logo em seguida, entrei na via e tratei de tentar entender o estilo da cueva. Se você é fraco, é preciso achar os entalamentos à medida que vai escalando para aliviar os braços e ter energia para chegar na corrente que fica lá na casa do chapéu, na borda da caverna.

Depois tentei à vista um 8b clássico chamado A Bruxa, mas acabei pulando um descanso-chave e faltou energia para clipar a parada.
Aproveitando as costuras do Afeto, tentei outro 8b em flash, mas, a essa altura do campeonato, minhas energias estavam no fim e caí novamente no final.
Tomei um voo no boulder final e fiquei balançando na corda. De repente, comecei a me sentir nauseado. Ficar descansando de cabeça para baixo, somado à falta de prática nesse tipo de terreno, me deixou mal e tive que descer.
Jardineiro

No dia seguinte, acordamos um bagaço. O tempo, por outro lado, já amanheceu mais estável. As chuvas esparsas da manhã foram bem fracas e tudo indicava que teríamos um bom dia para fazer parede.
Mesmo destruídos do dia anterior, resolvemos — ou melhor, eu escolhi — entrar na Jardineiro (6o, VIIa, E2, D3, 310m), no Morro do Enxadão.
Sob condições normais, parecia uma escalada tranquila, mas a gente estava bem cansado e, para o Ismael, seria o limite do grau. Dias atrás, ele mandou seu primeiro 7a e essa via tem 9 enfiadas, com duas enfiadas de 7a.
Segundo o novo guia de escalada, o livro do Daflon & Cíntia, e alguns relatos que li na internet, a melhor estratégia seria escalar à tarde, quando a pedra fica na sombra.
Como vi que as cordadas levavam de 3 a 8h, achei melhor entrar um pouco antes do meio-dia para ter uma gordurinha e ir preparado para descer à noite.
Por volta das 10h30, saímos do refúgio e chegamos à base da via sem dificuldades.
Combinamos de escalar em blocos para ganhar tempo nas transições. Eu pegaria o primeiro bloco até a metade da parede e o Afeto, a outra metade.
Por volta das 11h30, iniciamos a escalada. Toquei a primeira enfiada sem grandes dificuldades e depois emendei a 2ª com a 3ª. Ganhamos um bom tempo, mas sofri para puxar a corda, principalmente no final da enfiada.
Depois toquei a quarta, que já foi mais curta, 30 m. Com menos atrito, a escalada fluiu melhor, mas uma chuva de um minuto “babou” as agarras e exigiu atenção extra.

Na P4 fizemos um descanso maior para troca de bloco.
A partir dali, o Afeto assumiu a ponteira e o Ismael e eu fomos de segundo até o cume.
O primeiro 7a da via fluiu bem. Já o segundo achei um pouco mais difícil, porque precisa usar uma agarra estranha.
A escalada fluiu bem, mesmo com a verticalidade da rocha. O Ismael, que não está acostumado com a graduação, mandou bem e subiu todas as enfiadas sem roubar, mesmo levando um jumar de backup.

Chegamos no cume às 16h30, após 5h de escalada.

Fizemos um lanche rápido e ficamos no cume 30 minutos cronometrados, porque sabíamos que a descida seria difícil.
Logo no segundo rapel, a corda prendeu num grampo e o Afeto teve que calçar a sapatilha para recuperar a corda.
Estávamos com duas cordas, mas resolvemos descer de 30 em 30 por causa dos bicos, grampos e principalmente do vento.
Para ganhar tempo, utilizamos uma técnica em que sempre tínhamos dois rapéis na sequência montados para otimizar o uso das cordas. Com isso, em 1h30 conseguimos realizar 10 rapéis e chegar ao chão às 18h, já com as luzes das lanternas.
Pelo menos para mim, foi uma escalada superdivertida, mas, mesmo assim, cheguei cansado à base.
Dali, fomos direto para o Umburguer comer hambúrguer com fritas e um sorvete de açaí de sobremesa.

Parte 2
Após três dias de escalada, hoje é nosso dia de descanso. Para mim, a sensação é de que hoje é o primeiro dia de descanso da viagem, já que no outro fizemos toda aquela função de sair de Itatim para Lençóis. A idade mostra que há diferença entre não escalar um dia e passar o dia ativamente fazendo outras coisas.
Assim que chegamos a Lençóis, colamos com o Rudy e a Luan, escaladores locais e conquistadores da maioria das vias mais modernas.
Pai Inácio, esportivas

Começamos os trabalhos nas vias esportivas do Pai Inácio, um setor supernovo que ainda nem possui croqui publicado. Esse setor fica à direita da via Pauliceia Baiana, provavelmente a mais clássica da pedra.
Nossa ideia original era fazer essas esportivas para nos adaptar à rocha e ao estilo local.
A geologia da Chapada é única. Talvez somente nos tepuis de Roraima haja escaladas nesse tipo de rocha e estilo.
Como o Rudy é um profundo conhecedor e equipador do setor, nos recomendou começar os trabalhos numa via chamada Gravatinha (7b), a mais fácil do setor. Para me incentivar mais ainda, falou que havia um lindo diedro em móvel.

Carreguei o rack e fui à luta. Logo de cara, ficou claro que a leitura no quartzito da Chapada seria difícil. Pouco magnésio, muitas marcas falsas e batentes variados. Em poucos metros, senti o flash pump, mas segui. À medida que ia subindo, a escalada ficava cada vez mais difícil e logo identifiquei o crux. Só de olhar, eu sabia que iria cair. Insisti no crux, mas acabei caindo. Tentei isolar o lance, mas não consegui tirar o movimento-chave. Comecei a sentir a pele na rocha áspera e resolvi desistir, porque ainda tínhamos vários dias de escalada pela frente.
Logo em seguida, o Afeto também entrou para aquecer e… mesma coisa. Ele desequipou no meio da via e o aquecimento estava feito.
Descemos e fomos xingar o Rudy. Nossa incompetência era culpa do Rudy. Aí veio a primeira lição da Chapada: as vias daqui são sandbags!
Já tinha ouvido falar sobre isso, mas não imaginava que fosse tanto assim.
Depois entramos num 7c do lado. Confesso que fiquei com receio. Se eu nem estava isolando um 7b, o que esperar de um 7c? Nem sair do chão?
O Pedrão, outro escalador radicado de São Paulo que também estava conosco, equipou a via. Pelo menos já peguei sacado.
Essa via já fluiu melhor. Após um boulder na saída, parecia que iria sair à flash, mas me embananei numa leitura mais acima e não vi uma agarra chave.
O Afeto entrou em seguida em flash e mandou a primeira via da trip na Chapada.
Logo em seguida, dei mais um pega e a cadena saiu mais de boa.

Segunda lição da Chapada: escalar à vista é mais difícil. O flash fica bem mais fácil; e de segundo é bem mais de boa. Sempre será difícil achar as agarras.
Encerramos o primeiro dia com muitos aprendizados e fomos comemorar a surra no centrinho de Lençóis.

Barro Rosa
No dia seguinte, o Rudy e a Luan nos “aplicaram” num setor chamado Barro Rosa. Esse setor tem uma caminhada de uns 40 minutos por um lajão com pouco ganho de elevação.
À primeira vista, o setor assusta pela negativa das vias e pelo aspecto de pouca agarra.
Além disso, eu estava cansado dos dias anteriores, então parecia que iria faltar força.
Nesse dia, o Coisinha, escalador de São Paulo e parceiro de trip para a Espanha em 2012, nos acompanhou na escalada.

Entre atualizar as conversas e outras fofocas, comecei aquecendo num 7a que foi regraduado para 7b esses dias.
O fantasma do 7b do dia anterior nos assombrava, mas fomos à luta.
Entrei sacando e logo descobri que as agarras eram boas, mesmo naquela negatividade. Além disso, há bons descansos que não são visíveis do chão. Mas, no final, mais um erro de leitura numa agarra marcada de magnésio me fez perder o à vista.
Depois, o Afeto entrou na mesma via e mandou sem grandes problemas.
Uma vez aquecido, a Luan disse que tínhamos que entrar na Pink Floyd (8a), uma obra-prima do setor.
O Afeto entrou à vista e foi “sacaneado” por um tick mark falso logo na saída, perdendo o à vista. Depois subiu isolando e, logo em seguida, mandou a via.
Aproveitei a oportunidade para tentar em flash, já que com os betas, a escalada ficava mais fácil, mas acabei me embananando no final.

No pega seguinte, caí da última agarra e só consegui a cadena na entrada seguinte.
Foi uma cadena amarga, mas ali aprendi mais uma lição importante: se no à vista caí bombado, na terceira entrada mandei sobrando. Ou seja, uma vez familiarizado, a via fica mais fácil e você começa a achar que esses decotadores têm alguma razão.
Beco da Coruja
No dia seguinte, o ideal seria descansar, mas como já estávamos com os equipos por ali, achamos melhor deixar tudo no setor do lado, Beco da Coruja, e voltar no dia seguinte mais leves.
O terceiro dia foi mais difícil. Mesmo após uma boa noite de sono, o cansaço não havia ido embora.
A aproximação, mesmo mais leve, foi mais dura por causa do forte calor que refletia na laje preta.
Nesse dia, o Potter, escalador gaúcho que se mudou para Lençóis, nos acompanhou juntamente com o Rudy e a Luan.
Mesmo estando perto do Barro Rosa, o setor é totalmente diferente. Lembrou um pouco o Setor da Perseguida na Serra do Cipó. Outro aspecto que chamou minha atenção foi a vegetação exuberante do local. Parece um pequeno oásis no meio do cerrado (?).
As vias desse setor são mais verticais a levemente negativas e a graduação mais amena.
Aquecemos num 6c bem justo. Foi minha primeira escalada que fluiu de verdade em dois dias. Depois entramos na via Feijões Mágicos, via benchmark do setor. O Afeto ainda tocou a extensão desse 7a, que vira um 8a após virar um teto.

Em seguida, entrei num 7b recomendado, Mundo de Greyshull, mas achei um pouco cruxy.
Dali, resolvemos entrar num negativo de 45°, onde a Luan e o Potter estavam batalhando.
Inicialmente, não estava nos meus planos entrar numa via tão negativa no terceiro dia, pois estava além da minha capacidade, mas não resisti depois que o Afeto mandou em flash. A via tinha muito da minha escola: negativo de quatro chapas e um final tranquilo.
Dessa vez, aproveitei todos os betas e mandei em flash também.
Logo em seguida, o Potter, aproveitando a porteira aberta, também mandou a via.

Lição do terceiro dia: uma vez adaptado, a escalada começa a fluir melhor.
Agora é descansar de verdade! Nada de descanso ativo! Tomara que o Afeto pense o mesmo!
Parte 3
Após o dia de descanso, fomos, Afeto e eu, escalar a via Pauliceia Baiana no Morro do Pai Inácio.

Pai Inácio

Deixo aqui as impressões pessoais que escrevi logo depois da escalada:
1ª enfiada: a via começa num grande diedro, bem óbvio quando visto do mirante. Em alguns textos falam “posto de gasolina”, mas agora é um restaurante com hotel (2025). Cuidado para não confundir com o diedro da direita, que parece muito, mas a linha é lá na esquerda.
Como já tínhamos feito essa trilha dias atrás para ir nas esportivas, levamos 15 minutos de aproximação.
Choveu um pouco pela manhã e, mesmo começando mais tarde, às 9h, o início da via estava úmido. Não sei dizer se é sempre assim, mas achei estranho e um tanto desconfortável.
A enfiada segue por um diedro bem protegido e depois uma travessia por baixo de um teto leva para uma canaleta. A travessia é mal protegida, mas os lances são fáceis. Ao final da canaleta, um buraco formado por blocos entalados te leva a um platô confortável. Como usei todas as peças médias, ficou ruim montar uma parada nas micros. Com isso, usei 4 peças para garantir redundância. Dica: reservar um #2 para a parada.
Rack e fitas: usei como referência o livro das 50 clássicas. Lá recomenda 12 costuras; levamos menos e compensamos com algumas fitas de 60 cm com um mosquetão. Além disso, levamos fitas de 120 cm, 180 cm e duas de 240 cm. Todas tiveram muita serventia por causa das travessias e tetos. Os nuts substituímos por um jogo completo de nut offset. De corda, levamos uma de 60 m; se tivéssemos uma de 50 m, agilizaria mais ainda.
2ª enfiada: começa num lance aéreo virando um balcão. O lance é protegido, mas acho que, em caso de queda, poderá dar platô. Depois entra numa canaleta com cactos até um platô OK. Nessa parada usamos peças médias a pequenas num bloco. Estranho, mas OK!
3ª enfiada: segue pela fenda da direita (pela esquerda é furada). Depois, um lance negativo em agarra te leva a uma virada, o crux da enfiada. Algumas agarras são suspeitas, mas nada difícil. A parada foi num bloco razoável por falta de opção. Lembro que usei 2x #2 e mais alguma coisa. À esquerda tem uma Pingo de alguma outra via nova.
Usamos a contagem de enfiadas do livro do Daflon e não emendamos com a travessia para cortar o atrito.

4ª enfiada (travessia): de boa, um pouco aérea, mas OK. O difícil é achar o final da travessia para tocar para cima. A dica é não passar de um grande diedro que vem de baixo. Nessa parada usamos peças pequenas (micros) e uma peça média. Parada pequena num platô apertado.
5ª enfiada (crux da via): começa com lances em blocos encaixados e muito suspeitos. As peças ficam igualmente suspeitas, mas sempre em agarras boas. Uma travessia por baixo do teto te leva para uma chaminé/diedro fechado de meio corpo. A travessia é mal protegida, mas dentro do diedro/chaminé há boas colocações. Usei um #0.75 e um #1 ou #2 (não lembro). Depois, um lance aéreo pela direita te leva a um grande platô. Essa foi a parada mais “bomba” de toda a via. Usei uns nuts médios a grandes e um #3.
Última enfiada: segue pela esquerda num grande varandão até virar uma aresta. Depois há a opção de sair pelo mato, ou pela face, com várias agarras horizontais que também servem de proteção. A última opção é a mais estética. Parada no cume usando uma árvore.
Escalamos a via em 3h, iniciando às 9h30 e finalizando às 12h30. Em meados de outubro, conseguimos escalar na sombra até a 5ª enfiada; depois o sol pegou.
Esse dia foi bem light, mas à noite sentimos o efeito do sol e ficamos um pouco cansados.

Mundo Perdido
No dia seguinte, resolvemos entrar na via Mundo Perdido na Pedra do Camelo, conquistada parcialmente em solitária pelo Rudy em quatro dias de parede. Segue abaixo o relato que fiz depois da escalada:
Achar o início da via já foi um crux. No desenho do croqui não fica muito claro e, pela natureza do lugar, não tem como se afastar da parede para ver de longe a pedra. Só achamos a base de primeira porque, no dia anterior, vi um vídeo do Elder que filmou em primeira pessoa a escalada da 1ª enfiada. Ali deu para ver bem o diedro da saída. Na verdade, tem um pequeno totem com diedro nos dois lados. O início fica no diedro da direita.

1ª enfiada: sai protegendo nesse totem e logo segue pela face da pedra, onde há 2 chapeletas. Depois continua protegendo nas fendas horizontais até a parada, que fica um pouco à esquerda. Tem um Bonier dupla mais alto e uma Pingo num platô.
2ª enfiada: segue virando um balcão (crux) e sobe buscando um diedro não muito evidente. Nesse trecho há algumas agarras estranhas, soltas, e depois domina um platô igualmente cheio de blocos soltos. Essa enfiada é toda em móvel, exceto na base do diedro, onde há uma chapa numa parede laranja, antes de um lance técnico.
É possível juntar as duas primeiras enfiadas, mas como tive uma experiência ruim na Jardineiro, resolvemos escalar sem emendar.
Até esta enfiada, devido à inclinação positiva da parede, escalamos com as mochilas. Dali para cima, içamos a mochila com uma tagline por causa da negatividade da rocha.

Rack: corda de 60 m, tagline de 60 m, 1x #0.1–#4, 2x #0.4–#2, 14 costuras e um jogo de nut offset. Esse rack é o recomendado pelos conquistadores e foi bem confortável. Quem conhece a via poderá levar menos peças, talvez dispensando os microfriends para aliviar peso.
3ª enfiada: onde começa a brincadeira. A enfiada é negativa, com chapas logo na saída, e segue em móvel por uma espécie de diedro até a parada. Apesar da negatividade, há diversos platôs e pontos de descanso que ajudam a aliviar o braço. No trecho em móvel, as proteções são regulares e sólidas.
4ª enfiada (crux da via, ~45 m): possui aproximadamente 14 chapas, mas há trechos em que precisa completar com peças, incluindo laçada de buraco. A enfiada é bem negativa, mas há pontos de descanso ao longo da enfiada após cada lance mais negativo, principalmente entalando o joelho. O lance mais estranho é na chegada, logo depois de um diedro, numa travessia na base do teto para chegar na parada. Ali a rocha é mais duvidosa, exigindo boas escolhas.
A P4 marca o fim do trecho negativo.

5ª enfiada: segue toda em móvel, sempre protegendo nas gavetas. Há boas colocações ao longo da enfiada e a rocha é bem sólida. O mais difícil é a navegação, pois há diversos caminhos. Após a primeira virada de balcão e subir uma placa com várias gavetas, buscar um platô com mato mais acima. Acima desse platô há uma fenda vertical que forma um diedro fechado e, logo acima, contornando pela direita, a parada.

6ª enfiada: mira o platô mais evidente acima. Segue em móvel praticamente reto para cima. O ponto da virada é facilmente visualizado por uma falha na vegetação. O crux da enfiada é justamente nessa virada, onde precisa dominar dois pés de canela-de-ema e rezar para não soltar; por isso, é importante colocar boas peças antes.
No platô, acabamos saindo da via e finalizamos a escalada pela chaminé da esquerda, subindo a linha mais natural da rocha. A via original sai pela direita por uma enfiada de 7a, mas não vimos a linha com facilidade por causa da vegetação.
Chegamos ao cume às 16h30, após 6h de escalada.

A descida caminhando é bem macetosa. É mandatório ter o tracklog, principalmente no cume. Além disso, há um longo trecho de corda fixa na descida da grota que exige atenção e braço, pois há trechos negativos.
Por sorte, o Rudy e o Claudiney vieram repetindo a via e nos encontramos no cume. Com isso, a descida foi bem tranquila.
Como a viagem estava no final e ainda havia muita pedra para conhecer, suspendemos o descanso depois das duas trads e resolvemos escalar os outros dois dias, totalizando quatro dias on.
Barro Roxo
No terceiro dia, o Rudy e a Luan nos aplicaram no setor Barro Roxo, um clássico de Lençóis! Visita mais do que obrigatória!

Já conheci muitos setores, mas o Barro Roxo é diferenciado: parede negativa, agarras boas e muita continuidade. Lembra um pouco o Barro Rosa, mas sem os descansos — e com o dobro da distância de caminhada.

A aproximação foi sofrida por causa do sol do meio-dia e também por causa da escalada do dia anterior.

A escalada até que rendeu dentro do possível. Saí de lá bem motivado a retornar um dia para provar outras vias e resolver as pendências.

Barro Branco
No quarto dia, fomos conhecer o setor Barro Branco, um pico de metaconglomerado com quase nada de caminhada.
Conglomerado é uma rocha bem familiar para mim e tenho bastante apreço por esse tipo de escalada.

Achei o metaconglomerado do Barro Branco incrível! Padrão internacional! Não imaginava que no Brasil poderia haver um conglomerado com tamanha qualidade.

Como estávamos no final da viagem, senti um pouco a pele e, mais ainda, o cansaço. Pela quantidade de vias com qualidade acima da média, sem dúvida é um setor para voltar.

No dia seguinte, iniciamos o longo caminho de volta para casa. Assim como na ida, na volta paramos em Itatim para pernoite. A ideia era escalar à tarde, mas estávamos tão cansados que só fomos ver o pôr do sol de uma pedreira.

Agradecimento a todos que tornaram esta roadtrip inesquecível: ao Afeto, parceiro de cordada e de risadas; ao Ismael, pela hospitalidade no Refúgio Frei e pelo churrasco à moda gaúcha; ao Rudy e à Luan, pela parceria, betas precisos e por abrir as portas da Chapada; ao Pedrão, Potter, Claudiney e ao Coisinha, pela presença e energia boa nas esportivas. Valeu demais por cada conversa, beta, escalada e pôr do sol compartilhado!

6 respostas em “Roadtrip Bahia”
Bom demais. Seus relatos acabam sendo ótima fonte de betas para futuras escaladas. Obrigado por compartilhar a experiência!
Vlw Felipe! Tmj!
Rapaz é de tirar o fôlego, três dias de escalada pra um de descanso.
Excelente relato da Chapada, vou usar as infos de “guia de role” numa próxima visita.
Bora! Chapada é o futuro da escalada!
Mais uma #Arimatur na conta, obrigado por compartilhar esses momentos especiais japa, até a próxima!
Vlw Afetones por aceitar o convite!