Em abril de 2015, quase dez anos atrás, Afeto e eu conquistamos uma via chamada “Rumo à Nascente”, na localidade de Vale da Lembrança, em Castelo – ES.
Foi uma conquista ao melhor estilo fast and light. Tocamos mais de 300m de conquista em 4h, levando restritamente o necessário. É claro que acabamos pagando o preço da leveza, pois passamos sede e falta de chapeletas.
No último rapel, só tínhamos uma chapeleta para fazer a parada e acabamos descendo de uma parada simples. Mas aquilo me deixou com a sensação de trabalho mal feito e sempre quis voltar lá para consertar o último rapel.
Além disso, durante a conquista, na 5a enfiada, acabamos entrando num trepa-mata por não termos chapas suficientes para tocar os metros finais. Se tivéssemos mais chapas, teríamos entrando pela face da pedra, evitando o trecho de mato, e conquistando uma bela enfiada de agarrência.
O tempo passou voado e nunca surgiu a tal oportunidade para fazer esses serviços. Até que, no último sábado, surgiu a oportunidade esperada, depois de 10 anos após a conquista.
De alguma forma, fechamos uma barca das mais clássicas, com o Chuck e o DuNada.
Na minha memória, a via era muito fácil e tranquila, então fomos sem pressa para repetir a via. Se conquistamos uma via em 4h, provavelmente iríamos repeti-la em 2h. Só que não…
Saímos de Vitória às 5h e por volta das 7h30 estávamos passando por Cachoeiro de Itapemirim para pegar o DuNada em casa. Tomamos um café pelo caminho e por volta das 9h estávamos chegando na região de Estrela do Norte.

Passamos na propriedade para solicitar passagem e por volta das 10h30 iniciamos a escalada após nos perder na mata.
A essa altura, eu estava começando a achar que a primeira repetição da via não sairia de graça, pois o calor estava de trincar pedra. E, como a face da pedra fica voltada para o norte, sabia que seria assim o dia inteiro. Tínhamos que torcer para nublar ao longo do dia e ter uma brisa para refrescar um pouco.

Começamos a escalada com o Chuck pegando as enfiadas ímpares e eu as pares. Assim, eu poderia guiar as enfiadas que o Afeto conquistou em 2015.

Na terceira enfiada, quando o Chuck estava no trecho final da enfiada, protegido com chapeletas, falou que uma das chapas estava totalmente amassada. Por sorte, o bolt não ficou danificado e ele conseguiu passar uma fita para proteger o lance e finalizar a enfiada. Assim que ele chegou na parada, P3, mais uma vez, outra chapa estava amassada e dessa vez com o bolt comprometido.
Na hora lembrei dos grampos da via Normal da Chaminé Brasília, na Pedra da Agulha em Pancas que também estão com vários grampos amassados. Em ambos os casos, as proteções foram amassadas em virtude de quedas de blocos, provavelmente durante alguma chuvarada mais forte.
Como estávamos subindo com a furadeira e algumas chapeletas para abrir a variante, substituímos rapidamente as duas proteções amassadas.

Chegamos na P4 por volta do meio-dia. A essa altura, nós estávamos sofrendo com o calor e a desidratação. Estava tão quente na parede que era impossível ficar de pé no chão nas paradas. Em geral, quando chego nas paradas, costumo tirar a sapatilha para descansar os pés, mas dessa vez estava impossível. Tinha que tirar a sapatilha e calçar o tênis para não queimar a sola.
O nosso estoque de água também estava bem baixo, mas sabia que, se concluíssemos a via, teríamos acesso a uma bica d’água no cume que era potável (?). Inclusive, o nome “Rumo à nascente” é justamente por causa desse córrego que tem no final.
Em vez de repetir a quinta e a sexta enfiada pelo trecho de mato, conquistamos uma variante pela face da pedra, abrindo uma bela enfiada mista de 55m com cinco proteções fixas. Conquistei liberando a enfiada e presumo que seja um V grau, talvez V SUP.

A partir dali, a escalada ficou mais amena e conseguimos imprimir velocidade para chegar quanto antes à nascente. O sol seguia nos castigando e queríamos terminar a escalada quanto antes para chegar na sombra e nos hidratar.
Por volta das 15h chegamos na tão desejada e sonhada nascente, onde, finalmente, pudemos descansar um pouco. Tomamos um pequeno banho para nos refrescar e acabamos tirando um cochilo na sombra.
Estávamos tão esgotados pelo calor que o cochilo foi essencial para garantir as energias para a longa descida que ainda nos aguardava.
Por volta das 16h iniciamos o rapel. Na P4, vimos que uma das proteções estava amassada, então resolvi fazer a troca, mas no meio do furo, a bateria arriou e o furo ficou pela metade. Claro que não levei o batedor e tivemos que descer do jeito que estava.

Como o rapel segue por uma linha independente a partir da P3, fiquei um pouco preocupado, pois se encontrássemos outras chapas inutilizadas ficaríamos em maus lençóis.

A primeira parada do rapel aparentemente escapou do bombardeio, mas quando cheguei no último rapel em chapa simples, encontrei a chapa e o bolt totalmente amassados. Sem bateria e sem batedor, não tive muita escolha senão buscar um pequeno arbusto à esquerda para fazer uma parada improvisada. Aparentemente, o arbusto era firme, mas o solo estava bem saturado, o que me preocupou um pouco. Fizemos uma parada sem botar muito peso e descemos na maciota até a base.

Chegamos ao chão já ao anoitecer, por volta das 18h e dali seguimos pela trilha até o carro para finalizar mais um dia épico na montanha!
Não lembrava que a via era tão legal, nem que era a plumo. Sem dúvida, é uma excelente opção de escalada para quem curte escalar em móvel. No entanto, ressalto mais uma vez, que essa via não é uma via para quem está começando a escalar em móvel, pois as colocações são difíceis e as paradas móveis nada triviais. Além disso, há pelo menos dois lances longos com proteções marginais.
Durante essa repetição, constatei que durante a conquista usamos uma corda de 70m e elaboramos o croqui achando que era 60m. Por isso, o primeiro croqui está com vários erros de metragem. Inclusive, esse é o croqui que consta no livro Escalada Capixaba. O croqui acima está sem esse erro, por isso a via ganhou alguns metros.
4 respostas em “Rumo à nascente 2.0”
Que incrível galera, vocês são demais ??
Cara, a via eh mto massa, nem me lembrava mais!
Acabou que vai ter que fazer uma terceira visita para corrigir o rapel né…só não pode demorar mais 10 anos hahahah
Pois eh, a via não me larga do pé! Qqer hora volto lá!