^ Pedra Aguda em Santa Teresa.
Tudo começou com um simples selfie que o Afeto mandou para mim. Era só mais uma inocente foto narcisista de uma pessoa no primeiro plano com uma montanha ao fundo. Mas o que chamou a nossa atenção foi que não reconhecemos a montanha, embora na legenda estivesse escrito “Pedra Aguda – Santa Teresa, ES”.
Uma rápida fuçada no Google Maps e bingo! Achei a pedra! Nos “cafundós dos Judas” de Santa Teresa, em meio a centenas montanhas, um pico de granito estava totalmente perdido e isolado. À primeira vista parecia um cume virgem, já que era impossível de subir caminhando. Restava saber se alguém já tinha escalado.
Marquei o “bonde” com o Afeto e no último sábado fomos conferir a tal “Pedra Aguda”.
O primeiro grande desafio foi ir lá. A pedra fica no meio do nada, distante das principais cidades e rodovias. Para chegar lá foi preciso se embrenhar numa rede caótica de estradas viciais em meio a pequenas propriedades e cafezais. Botei as coordenadas no GPS, mas nem ele conseguiu montar uma rota coerente, uma vez que várias estradas nem existem na realidade…
Tocamos 60km de asfalto pela BR-101 até a localidade de Pendengas. A partir dali, mais 30km de estrada de chão, confiando no GPS. Eu lembro que a certa altura estava subindo uma plantação de eucalipto e logo a frente tive que acionar o 4×4. Mais a frente, já estava com a reduzida ligada e quando nos demos conta, a estrada tinha acabado, assim, no meio do nada.
Meia volta, algumas paradas para perguntar para as pessoas e assim fomos. Difícil foi o que perguntar:
– Bom dia senhor, você sabe onde fica uma pedra que estamos procurando?
Depois de 2h 30 finalmente chegamos na pedra. Ela fica tão invisível que a vimos pela primeira vez a uns 50m de onde deixamos o carro para iniciar a caminhada.
Constatamos o que sabíamos pela selfie do cara, a pedra era pequena, uns 100m, no máximo. Miramos diretamente para uma fenda, mas logo ela se mostrou muito blocosa e pouco atrativa. Descartamos o costão oposto porque ele era muito liso e esfarelento. Arriscamos as fichas na aresta sudeste, que mesmo estando com sol à mil, parecia mais promissora, principalmente porque era a menor face.
Como a região fica a uns 900m de altitude, o sereno da manhã tratou de deixar o capim bem molhado para “facilitar” a nossa vida. Tocamos até o colo onde a pedra é menor e para nossa surpresa, descobrimos uma fenda de punho saindo do chão até o cume da montanha! Pronto, estávamos feitos! Em partes, porque como toda boa fenda, ela estava bem suja em alguns trechos, mas era melhor do que se lançar num costão liso queimando a panturrilha.
Peguei o “sharp end” e fui à luta! Entalando no granito afiado com uma mão e a outra limpando a fenda, ora com saca nut, ora tirando os espinhos. Estava decidido a subir conquistando e encadernado até o cume, mas já quase no final, um grande formigueiro acabou com o meu plano. Não tinha como passar sem antes bater uma chapa. Então bati a chapa, dominei o formigueiro abraçando-o e num movimento de heel-hook montei nele. Pensa num movimento bizarro e “animal”.
Dali para cima foi tranquilo. Cheguei no fim bati uma parada dupla e, sem chegar no cume, desci.
Como o sol estava muito forte, decidimos dar um tempo numa sombra até o sol virar e a via entrar na sombra. O problema foi achar uma sombra, já que o povo tratou de cortar todas as árvores em volta…
Assim que a via entrou na sombra, o Afeto pegou a ponta para fazer a primeira repetição da via. Carregou o rack de Camalot’s, olhou para cima, olhou para o rack e disse:
– Vou deixar esses #5 e esse #4.
– Cara, acho melhor levar esse #4, eu usei todos os três. Além disso, melhor levar pelo menos um #5.
Um pouco relutante, o Afeto pegou um #4 e um #5.
Assim que o Afeto chegou no cume fui de segundo para ir de fato até o cume da pedra. Quando eu cheguei no parada, ele falou:
– Japa, senti falta daquele #5 que deixei para trás! E se tivesse mais #4, eu usaria sem problemas!
Caminhamos até o cume a procura de algum vestígio humano. Quem sabe o André Ilha não passou por aqui? Talvez o Jean Pierre… Ou quem sabe um destemido morador da região com sangue de alpinista? Procuramos por grampos, cruzeiros e nada. Concluímos que o cume era virgem e festejamos a conquista.
Tiramos algumas fotos, descansamos um pouco e partimos para descida. Assim que montei o rapel e fui tirar o mosquetão da parada para iniciar a descida vi um carretel de linha de pesca no chão!!!! Caramba, “Que rolo é esse?”! Como isso foi parar aqui? Será que alguém já subiu aqui? Se sim, por onde? Mas quem iria trazer um carretel para o cume? Rolou aquela dúvida.
Em casa, pesquisei mais sobre o carretel e descobri que ele é feito/importado do Paraguai (Ciudad do Leste) e já saiu de linha. Pelo estado do plástico, parecia que estava no cume a pouco tempo. Outra pergunta é: e a linha? Onde está? Por que o carretel estava sem linha? Pela posição da montanha, é totalmente possível que alguém tenha lançado uma linha de uma montanha adjacente com um arco e flecha para tentar fixar uma corda mais grossa. Será que tentaram lançar uma corda? Mas será que conseguiram chegar no cume depois? O carretel foi encontrado exatamente no mesmo lado desta montanha.
A dúvida ficou no ar. Talvez seja preciso voltar lá novamente para checar outras linhas e tentar encontrar mais evidências. Mas se alguém escalou a montanha por outra face, por que levaria um carretel?O fato é que essa descoberta foi a nossa inspiração para batizar a via de “Que rolo é esse?”.
A via, que agora está mais limpa e sem espinhos, é uma boa pedida para quem busca uma escalada curta em móvel, num local com uma bela vista da região (dá para ver muitas montanhas da região) e um cume pequeno e limpo.
Para ler mais sobre a via, clique aqui!
3 respostas em “Que rolo é esse?”
Naoki, que massa, esse rolo é meu!
Marcos Antonio Coffler!
Tínhamos um grupo de primos que toda sexta feira da paixão fazíamos uma caminhada, e um ano antes eles foram nesta pedra e eu não pude ir, e eles não conseguiram subir, e no ano seguinte também pude ir, e analisando a fenda que mencionou, iniciei a investida e com sucesso, tendo apenas como desafio maior o bendito formigueiro, que na subida foi tranquilo mas na descida foi complicado, e quanto ao rolo ele foi usado para içar uma câmera na época nem existia celular com filmagem ainda, a minha escalada foi livre, na época era destemido, subi 2 vezes! Muito massa!
Bela reportagem!
Abraço!
Muito legal. Explorar a cidade onde morei por muito tempo! ! Que distrito é esse de Santa Teresa?
Santa Teresa é muito legal mesmo Douglas! Essa pedra fica no Distrito de 15 de Agosto. Abs