Afeto entrando no movimento crux da via “K-olho”. Pico 17 de Julho.
O centro-avante rouba a bola do adversário no meio do campo e parte em direção ao gol, dribla um, dribla dois; arranca pela lateral do campo deixando mais dois marcadores não chão, cruza a bola com perfeição na pequena área, o atacante só escora a bola para dentro do gol e estufar a rede! É gooool!!!!
O centro-avante praticamente fez o gol, mas o gol não foi dele porque ele cruzou a bola com perfeição e quem a tocou por último foi o atacante! Então foi gol do atacante que ficou só “pescando a bola”.
E o que isso tem a ver com escalada? É porque nesse final de semana, eu e o Afeto fomos o “atacante” de uma conquista (gol). E quem foi o centro-avante? O Sherpa Master Zudivan!
Pico 17 de Julho e seus picos satélites visto do cume do Pontão Maior.
A jogada começou mais ou menos assim:
Na 5a-feira o Afeto me disse que o Zudivan tinha o convidado para abrir uma via nos Cinco Pontões de Laranja da Terra. Ai, no conforto do ar-condicionado pensei: Cinco Pontões? Nesse calor sufocante? Tão loucos! E para piorar, lembrei que para chegar na tal linha era preciso subir o Pontão Maior, rapelar por corda fixa até a cangalha, fazer mais um rapel, escalar um trecho, fazer uma caminhada para finalmente acessar a base. Só nessa brincadeira vão 2 cordas fixas e mais 2 cordas para conquista. Como iríamos passar um longo dia seriam mais uns 3-4L de água, mais material de conquista! Somou tudo?
Era muito peso para carregar numa época não muito propícia e ainda com pouco tempo! Mas ai, o nosso centro-avante saiu driblando 2 jogadores e avançou para a o ataque! Ai, nós atacantes fomos só acompanhando a jogada.
Na sexta-feira, por volta das 17h o Zudivan me liga e fala:
– Naoki, já estou aqui nos Cinco Pontões! Estou no cume do Pontão Maior. Acabei de fixar as cordas para acessar a base da pedra e trouxe mais 4L de água para amanhã! Está tudo pronto!
Que isso?!! Ele simplesmente cruzou a bola e nós só precisávamos escorar a bola para dentro do gol!
Assim no sábado, às 4h30 eu e o Afeto pegamos a estrada e fomos direto aos Cinco Pontões. Três horas de estrada e 30 minutos de caminhada/escalada já estávamos no cume do Pontão Maior! E quem já nos aguardava lá? O centro-avante!!!
Descemos pela corda fixa até a cangalha e depois mais um rapel até a base e em pouco tempo estávamos na base do Pico 17 de Julho, o “gol” do dia!
Nós escalamos este pico em 2013 e durante a descida, num momento “viagem” deslumbramos uma linha na aresta oposta a via da conquista. Era uma linda aresta projetada para um abismo de 300m que chamava a atenção. A imagem ficou gravada na nossa memória até ser resgatada novamente.
Pontão Maior pela face da discórdia…
Olhando com calma, a linha parecia ser bem promissora. Tentamos achar uma saída, mas não teve jeito. Só há um ponto de saída, comum a conquista original. Então o jeito foi começar pela mesma saída e antes de entrar no “crux das bromélias” saímos da linha original em direção a uma fenda frontal para ganhar um platô já bem perto da aresta. Ali batemos a nossa P1, depois de 35m de escalada protegendo somente em móvel.
Já tive o prazer de ficar em algumas paradas memoráveis na minha vida. E essa P1, com certeza, vai entrar para a minha lista das “P”memoráveis, porque o lugar é absolutamente deslumbrante!
Na P1 da via. No outro lado da aresta, um buraco de 300m. É bom não deixar nada cair.
Zudivan jumareando a 1a enfiada com a nossa água! Ao fundo do Pico da Foca.
Dali para cima seria a tal aresta projetada para o vazio! A Pedra em si não se mostrou tão difícil, mas a exposição era realmente surpreendente. O Afeto conquistou o trecho final com muita maestria batendo apenas 3 chapas em 30m. Como vimos que ia ficar muito exposto (no sentido de perigoso). Resolvemos intermediar o lance batendo mais 2 proteções extras. Assim, a enfiada de E3 virou um E2 confortável com um crux de 5o SUP no meio.
Afeto conquistando a 2a enfiada.
Linha da via vista de um outro ângulo.
Batemos no cume, tiramos umas fotos e resolvemos sair um pouco daquele sol que estava castigando as nossas orelhas! Descansamos um pouco e como vimos que havia bastante tempo sobrando, resolvemos entrar na via que o Zudivan e o Baldin conquistaram na semana passada. Já que estávamos no lado não custaria nada entrar e de quebra levar mais um cume.
Livro de cume de 2001. Pico 17 de Julho.
Ah, batizamos a via de “K-olho” porque para fazer essa via o ideal é não olhar muito para a direita, o lado que fica o abismo. Então, manha é escalar com o olho direito fechado! Por isso o nome. E garanto por experiência própria que se olhar para o lado errado o coração vai disparar e vai achar que aquele cristal frágil vai quebrar e você irá mergulhar naquele abismo sem fundo!
Voltando a outra via! A via foi originalmente conquistada em 4 enfiadas com 2 trechos em artificial, na 2a e 3a enfiada, totalizando uns 120m de escalada. Tirando o 1o artificial que não conseguimos isolar o resto acabou saindo tudo em livre (5o SUP) e assim batemos no cume por volta das 16h.
Afeto na 3a enfiada da via Laços de Família (D1, E1, 5o SUP, A0, 120n).
Assinando o livro de cume.
Tiramos umas “selfes” e começamos a longa jornada de volta até Vitória (150km). Rapelar 90m é fácil! Difícil é no final do dia ter que jumarear de volta tudo isso! Recolher as cordas e descer a pedra para depois pegar mais 3h de estrada.
Ainda bem que, assim como na vida, o que importa é a alma!
Curtindo o final do dia no cume do Pontão Maior. Quente é pouco…
Se foi cansativo? Claro que foi, mas com certeza, não cansou nem a metade, graças ao nosso centro-avante que fez toda a mão adiantando toda logística das cordas fixas! Sem contar que o menino gosta de uma mochila pesada! Acho que em alguma reencarnação passada foi um sherpa. O fato é que na hora de descer o menino levou praticamente tudo para baixo!
Nosso muito obrigado ao Zudivan que foi a peça-chave para o sucesso dessa empreitada! E ao Afeto pela vibe positiva de sempre!
Centro-avante e sherpa, Zudivan com a sua cargueira “leve”.
Complexo Cinco Pontões visto a noite. Da esquerda para direita: Pico 17 de Julho, Pico Casagrande, Pitoco do Alemão e o Pontão Maior.
CROQUI
DICAS PARA REPETIÇÃO
- A via começa na mesma saída da via original e antes de entrar no crux das bromélias sair à direita em direção a uma fenda frontal onde cabem um Camalot #1 e #2 ou equivalente. A parada está logo acima da fenda.
- A segunda enfiada segue sempre pela aresta até o cume. Na última dominada tem um lance estranho que pode ser facilmente evitando dando uma grande volta pela esquerda.
- Para descer da via, com uma corda de 70m é possível de descer em 2 rapeis.
- Nunca reutilize as fitas abandonadas!!! Remova as fitas antigas com uma faca e substitua por uma nova.
Sol escaldante de verão.
Continuação do complexo dos Cinco Pontões. Ao fundo a Serra de Empoçado. Também é possível de ver a Pedra Azul, os Três Pontões de Afonso Cláudio e o Forno Grande.
4 respostas em “Gol de placa”
[…] Par ler o post sobre essa conquista, clique aqui! […]
Japa, uso as palavras do AFeto!
Você é incrível!!!
Parabéns!
Incrível demais!!
Japa sem palavras para agradecer pela vibe de sempre…Mais uma escalada memorável, muito obrigado!!!