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Vazamos!!!!

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Será que consigo concorrer à capa da Abertura de Temporada de 2015?

“Você vazaram!”

Foi assim que o senhor Laquini nos recebeu ao chegarmos na casa dele após a conclusão da via “A última Cartada”, em Castelo ES.

Essa longa história começou no final do ano passado e só acabou no último domingo de Páscoa, após muito suor, trabalho e sofrimento.

No sábado, enquanto estávamos conquistando a via “Sem querer querendo” com o Afeto em Guarapari, recebi uma mensagem de texto do Serviço Secreto de Inteligência Climática, a SSIC, dizendo que em Castelo o tempo estava muito bom!

Como já havia relatado, o tempo não anda muito firme por aqui nas últimas semanas. A semana passada foi de muita instabilidade em todo o estado. E a duas semanas, tomamos “a maior ruim” em Castelo achando que o tempo estava bom. Erro do SSIC…

Assim que ficamos sabendo do tempo bom, terminamos a conquista em Guarapari, voltamos correndo para casa para reunir mais equipos. Foi o maior corre-corre de última hora, pegar roupa, negociar alvará, reunir equipos, comida e tudo mais. Tem gente nem banho tomou… Foi direto!

Às 18h30, já estávamos novamente na estrada, vazia, eu e o Afeto, rumo à Castelo. O nosso terceiro integrante, DuNada já estava nos esperando em Castelo.

Quando passamos por Marechal Floriano o tempo virou e começou a chover de leve. Em Venda Nova, o tempo piorou mais ainda. Erro do SSIC novamente? Desânimo total dentro do carro. Pensei: putz mais uma vez? Não é possível… Quase desistimos ali mesmo, mas por precaução e teimosismo decidimos seguir até a pedra. Vai que…

Sorte nossa, porque assim que chegamos lá descobrimos que só tinha chovido de leve na região. Ufa, que alívio!

Tratamos de arrumar os equipos e descansar um pouco, porque o dia seguinte seria puxado e a alvorada, antes das galinhas. Por volta das 22h nos deitamos e assim que fechei os olhos: TUNT-TUNT-TUNT-TUNT!!!!!

O vizinho começou um festerê com o som à mil!!!! Parecia que a caixa de som estava no meu ouvido. Tentei em vão dormir. Até que lá pelas 3h da madrugada a festa acabou e consegui cochilar um pouco.

Às 5h, o despertador tocou e lá estávamos nós, os zumbis, em pé para começar o dia.

Café da manhã, aproximação e por volta das 6h começamos a escalada. Entrei voando na pedra, guiando as 3 primeiras enfiadas o mais rápido que pude para ganhar tempo. A estratégia era chegar no crux, P5, antes do sol bater na pedra, para assim, conseguir escalar o trecho mais duro na sombra. Por volta das 9h conseguimos bater na P5. Chegamos bem na hora em que o sol começou a pegar na pedra. Não estava perfeito, mas dentro do possível estava bom demais para aquelas condições.

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Guiando a 8a enfiada da via, mais conhecida como Enfiada Catando Milho. Foto: Caio Afeto.

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Da próxima vez que você estiver achando ruim o tamanho do regletinho do crux, lembre se das pessoas que não tem nada. Afeto usando a visão além do alcance para achar uma agarra.

Escalamos a 6a e a 7a enfiada, fizemos alguns registros (^) e partimos para cima, pois ainda tinha muita pedra pela frente.

A partir dali, o sol foi o nosso companheiro inseparável. E com a chegada do sol, as nossas energias começaram a diminuir. Bebíamos mais água e começamos a sentir os efeitos do TUNT, TUNT, TUNT da noite anterior, aliado ao acúmulo de cansaço da própria via.

Mais algumas enfiadas e chegamos ao ponto mais alto onde havíamos chegado na última investida. Já sabíamos que dali para cima seria mais tranquilo e que faltaria “só” mais uns 150m para chegarmos no cume. Mas é claro que, quando se está cansado,  tudo fica mais difícil.

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Lá no sul a gente chama isso de “na capa da gaita”. DuNada limpando uma das últimas enfiadas antes de chegar no cume.

O Afeto partiu para começar a conquista da 10a enfiada. Subiu 2m, olhou para nós e disse: bato uma chapa aqui? Olhei para o Dunada, olhei para a pedra e disse: toca para cima! Detalhe, era uma rampa de III grau.

O garroto tocou mais um pouco, fez o furo e em vez de martelar o chumbador, já queria apertar o parafuso.

– Afeto, tem que martelar antes!

Era o sol mais o TUNT, TUNT, TUNT da noite anterior cobrando o seu preço.

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Afeto partindo para os trechos finais. Daqui para cima foi na raça!

Mais duas enfiadas e estávamos na base do que parecia ser a última enfiada. Tinha que ser a última! Em meio a bromélias gigantes achamos uma passagem e terminamos 12a, e última, enfiada na sombra de uma grande árvore por volta das 15h.

Deixamos ali o livro de cume e rumamos para o topo por um costão final até o cume da pedra propriamente dita!

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Nos metros finais!

E as 15h45min, depois quase 9h de escalada finalmente chegamos no tão sonhado cume da Pedra de São Luis, após uma escalada de 470m! Aliás, depois dessa, vou fazer um curso de agrimensor… Porque estou mal…

De todos os cume que já tive o prazer de pisar, esse teve um sabor especial e também uma peculiaridade. Nós fomos recebidos pelo Sr Laquini no cume da pedra! Ele deixou os fazeres da casa, pegou a Rural dele, deu a volta na pedra e com uma garrafa pet de água gelada foi nos receber no cume e ajudar na longa descida de volta. Aquilo foi um alívio mental e físico imensurável. Quem já escalou uma montanha saber que a subida é apenas a metade do caminho, mas não dessa vez! Nós tínhamos o Sr Laquini que conhecia bem a trilha de volta e estava com a Rural mais abaixo, nos poupando de uma caminhada de quase 4km até a base da via, onde estava o nosso carro.

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Cumeeeee!!!!! Afeto, Roney, eu e o Sr. Laquini! 

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Contemplando as montanhas capixabas. Ou procurando a próxima encrenca?

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O resgate! Aqui, a regra o “cume é apenas a metade do caminho” não se aplica. Ufa!

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Sr. Laquini contando as suas aventuras montanhísticas. Mais uma produção Afeto Production, em breve!

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Estava só um pouco quente, mas coisa pouca…

Nas linhas finais, gostaria de agradecer à família Laquini por “só”: nos receber sempre de braços aberto; deixar dormir dentro de casa; fazer a cama do Roney; deixar pronto o café da manhã especial às 5h; ficar torcendo por nós na beira da piscina; nos esperar com um almoço/janta pronto depois da escalada; nos buscar no cume da pedra de carro; e por simplesmente nos receber como se fossemos um Laquini. Muito obrigado!

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Nosso sincero agradecimento à essa grande e maravilhosa família Laquini. 

Também quero deixar registrado a minha gratidão aos brothers de cordada, Afeto e DuNada que sempre aceitam as maiores roubadas do mundo com a maior naturalidade. Valeu equipe, agora “só” falta a Bandeira!

Croqui

A via tem aproximadamente 470m de escalada, 12 enfiadas e o grau médio 6o com crux de 7o SUP; Meia enfiada em A1 de cliff e também tem uma enfiada em móvel num diedro perfeito. Ou seja, é uma via grande e completa que exige muita pluralidade por parte dos escaladores. Acreditamos que para a repetição seja necessário aproximadamente umas 8h de escalada. Quanto ao grau de dificuldade em livre, é recomendável estar dominando a casa do 7o grau de agarrência pois, há diversas passadas com 6o SUP obrigatório. Com exceção do trecho em A1, todas as enfiadas foram liberadas ou isoladas em livre. Quanto ao grau de exposição, em geral, a via é bem protegida, com somente alguns trechos mais expostos.

Confira o croqui e a descrição das enfiadas.

Croqui da via “A última cartada”. Considerar distorção da foto e da pedra, principalmente perto do cume.

Versão PDF: A última cartada

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1a enfiada – Enfiada de corda cheia por dentro das canaletas de água. 60m.

2a enfiada – Continuação pelas canaletas até elas acabarem e entrar na face. 60m.

3a enfiada – Escalada de aderência com um crux de aderência de VIo grau no final. A parada fica antes de entrar na mata. Dali para cima, caminhada na mata até a base da quarta enfiada.

4a enfiada – Começa em móvel em uma laca e depois segue em agarrência, passando por baixo de um tetinho até a parada dupla.

5a enfiada – Enfiada totalmente em móvel por um diedro perfeito. Requer 2x Camalot #3 e #4. Camalot #5 opcional (fica melhor protegido).

6a enfiada – Enfiada crux de 7o SUP. Com passada de 6o SUP obrigatório. Escalada de aderência que exige muito jogo de pé. Sapatilha apertada ajuda!

7a enfiada – Outra enfiada de 7o grau com um crux (obrigatório) bem definito entre a 2a e a 3a chapa. Depois a escalada continua constante acreditando (e muito) nos cristais minúsculos.

8a enfiada – Enfiada tranquila de uns 30m até a base da próxima enfiada.

9a enfiada – Enfiada mista. Começa em artificial de cliff e depois segue em livre fazendo uma grande travessia à direita. Não subestime os lances finais!

10a enfiada – Enfiada tranquila mas com runout. A enfiada segue em diagonal à esquerda. 60m

11a enfiada – Enfiada tranquila em lacas. Parece difícil, mas é bem fácil. 30m.

12a enfiada – A enfiada segue para cima, entre as bromélias gigantes, fazendo a última virada em um lance de VIo grau. E depois segue em direção a uma árvore grande que fica atrás de um grande bloco. Parada Natural. O livro de cume encontra-se embaixo de um bloco gigante.

Dali para cima, escalaminhada pelo costão (100m) até o cume.

A descida é feita a pé pelo outro lado por uma trilha até chegar na estrada. A descida pela via é possível a qualquer momento, mas requer abandono de fita ou mosquetões, pois as paradas estão com chapa, por vezes, sem argola.

Equipos para repetição

  • 1 corda de 60m se tiver certeza de que vai sair por cima;
  • 10 costuras;
  • Camalot’s 1x #0.5, 2x #3 e 2x #4;
  • 2 cliff’s de buraco;
  • 1 par de estribo;
  • Fitas e mosquetões de rosca;

Dicas gerais

  • Uma boa sapatilha de precisão é quase que mandatário no crux e em algumas enfiadas de aderência;
  • A pedra está voltada para a face norte com sol o dia inteiro. No inverno, o sol pega na pedra por volta das 9h e no verão, um pouco mais tarde;
  • Muito cuidado com os raios. Região altamente propensa à descarga elétrica;
  • Caso não queira repetir todo a via, vale muito a pena repetir as 3 primeiras enfiadas.

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