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Seis Estrelas

Seis Estrelas é o nome que Rodrigo e eu batizamos para recente conquista na Pedra Torta de Águia Branca – ES. Mas para entender um pouco mais sobre a história dessa via é preciso voltar um pouco no tempo e ler o post sobre a conquista da Fissura do Milagre que levou a conquista da via Jardim dos Cristais.

E justamente, enquanto conquistávamos a Jardim dos Cristais, visualizei um pequeno totem no outro lado, na Pedra Torta. Até onde aprendi sobre totens, em geral, são excelentes lugares para ter fendas e agarras. No entanto, as fendas laterias do totem são sempre diedros sujos e largos, sem potencial para vias. O segredo é sempre olhar no dorso do totem em busca de fendas e fissuras. Por isso, esse totem da Pedra Torta não se mostrou tão interessante, pois as únicas fendas estavam justamente nas laterais, sendo que uma das laterias era tomada de mato, restando apenas o outro lado.

Complexo de vias da Pedra Reta e Pedra Torta.

O lado esquerdo parecia promissor, principalmente no final, mas o início era uma incógnita, pois ficava na mata. Então só havia uma forma de descobrir: ir até a base!

Totem da Pedra Torta.

O objetivo da última escalada não foi essa, mas sim, voltar a via Jardim dos Cristais e liberar as enfiadas, principalmente a 5a enfiada, passada em artificial. E, se, porventura, desse tempo, dar uma pescoçada no totem.

Para essa empreitada convidei o Rodrigo. Em 2017, Rodrigo e eu tentamos abrir uma via na face oposta da Pedra Reta, sem sucesso. Então achei que seria uma volta justa para escalar, mesmo sendo pela face oposta, a pedra que um dia tentamos subir.

Chegamos a Águia Branca por volta das 8h. Passamos na mesma propriedade e tentei, em vão, explicar porque eu estava de volta, dessa vez, com outro amigo. Para algumas pessoas é difícil entender o que leva uma pessoa viajar 3h de carro para subir uma pedra sem ganhar nada em troca (financeiramente).

A aproximação foi tranquila, pois o pasto que há um mês estava mais alto, agora estava mais baixa pelos bois, mas mesmo assim a subida foi puxada devido ao sol que estava implacável.

Iniciamos a escalada às 8h30 com Rodrigo na ponta da corda para guiar a primeira fissura de 30m. Depois peguei a segunda para liberar, já que na conquista tive que parar para bater uma chapa. Entrei meio displicente na enfiada, achando estar com jogo ganho, mas logo descobri que a fissura seguia suja. Por falta de concentração, protegi mal a enfiada e logo escalei tão adrenado quanto da primeira vez. Lição aprendida, nunca menosprezar uma enfiada!

Na saída da via.

A 3a enfiada ficou com Guizzardi novamente que de brinde levou a 4a também. Essa, ele passou com maestria! Eu, por outro lado, escalei desleixado porque estava de top, entrei com a cabeça errada e quase cai! Pura falta de concentração e respeito pela própria via!

Rodrigo nao grande arco da terceira enfiada.
Curta, porém intensa 4a enfiada.

Chegamos na P4 por volta das 11h. A próxima enfiada, a 6a, foi conquistada em artificial, mas sabia que daria para passar em livre. O crux consiste num pequeno boulder em chaminé de meio corpo para ganhar uma agarra de mão. O lance deve ter uns 3m. Tentei com o ombro direito para dentro, do mesmo jeito que tentei na conquista, mas não consegui ganhar o lance. O Rodrigo sugeriu tentar com ombro esquerdo para dentro, mas também não consegui. 

Cada tentativa exigia muito esforço e força, àquela altura do campeonato não era o que eu tinha muito. Fiz uma longa pausa para tentar novamente. Apostei as fichas no ombro direito para dentro novamente e meio que na sorte consegui subir o pé numa pequena saliência que me levou a agarra da salvação. Fiz tanta força nessa saída que subi me arrastando o resto da enfiada.

Como sabia que o Rodrigo viria de segundo, resolvi fazer uma parada intermediária a uns 30m, em vez de esticar 60m de corda, pois sabia que com corda cheia, em caso de queda, o participante iria cair no platô, mesmo com a corda retesada.

O Rodrigo veio de segundo após roubar o boulder da saída e finalizamos a escalada na parada intermediária, sem tocar os últimos 30m de trepa mato até o cume da pedra.

Croqui atualizado.

Com isso, conseguimos descer toda via com apenas uma corda de 70m. E por volta das 13h já estávamos no chão para um merecido descanso, pois o sol estava castigante.

Almoçamos, nos hidratamos e ficamos ali jogando conversa fora, esperando o sol dar uma trégua.

Por volta das 14h fomos conferir o tal totem. Assim que chegamos no totem constatamos que a base do totem estava tomado de mato, mas por sorte, mais a esquerda, havia uma grande laca secundária toda limpa que poderíamos usar para contornar a parte sujo. Essa laca inicial se mostrou muito interessante com um belo crux em invertida logo na saída. Lembrou um pouco o crux da via Luna Crescente em Val di Melo.

Ofereci a ponta ao Guizzardi, mas ele falou que estava muito cansando. Então peguei a ponta e toquei a enfiada até ganhar a laca e estabelecer a P1 após uns 20m de puro desfrute por uma laca de mão bem sustenida.

Mais uma vez ofereci a corda para o Rodrigo, que outra vez me passou de volta para tocar a enfiada seguinte. Passei por um curto trecho de espinho e logo cheguei na base de uma chaminé estreita de uns 5m. Considerei tocar direto, mas a última peça era um nut numa laca podre, então achei melhor bater uma chapa para virar o lance. A chaminé me levou a um platô onde começaria o filé da via: uma laca de uns 20m contínua em fenda de dedo. Algo surreal e quase impossível de achar na lateral de um totem. Simplesmente fui escalando sem acreditar e pensando o tempo todo: agora vai sumir a fenda! Agora não vai mais ter como passar em livre! E nada de a fenda sumir. Simplesmente escalei incrédulo toda fenda até chegar no topo do totem após esticar 40m de corda!

No diedro da 2a enfiada.
No cume do totem.

Bati uma parada e chamei o Rodrigo que subiu, igualmente maravilhado com a fenda final.

Lá pelas tantas, ele soltou:

– Essa fenda é seis estrelas!

Assim nasceu a via “Seis Estrelas”!

Para futuras repetições, a dica é escalar a Jardim dos Cristais pela manhã e entrar na Seis Estrelas a tarde. Sem dúvida é a combinação perfeita para lavar a alma e aproveitar ao máximo o dia esse pequeno paraíso das fendas em Águia Branca!

Complexo da Pedra Torta ao entardecer.

Por fim, agradecimentos ao Guizzardi por dividir a corda na primeira repetição da Jardim dos Cristais e pela conquista da via Seis Estrelas!

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