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Diário de uma pandemia – mês 1

Essa semana, completo pouco mais de um mês de isolamento social e muitas coisas aconteceram nesses últimos dias. Escrevi alguma coisa no início da pandemia, mas na época, não sabia bem como seria esse período. Hoje, depois de quase 4o dias, dá para ter uma visão mais ampla do cenário.

Eu tive a noção da seriedade da situação em meados de março, quando foi levantada no meu trabalho a possibilidade de fazer home office. Na época, não botei muita fé, porque para o meu tipo de trabalho, isso seria algo bastante complexo. Lembro que a alguns anos atrás, fiz uns testes para implementar esse tipo de trabalho, mas o projeto não foi para frente por causa dos dificuldades técnicas. O computador que uso para o dia-a-dia deve custar o preço do meu carro. A memória RAM da máquina, tem o tamanho de 2 SSD’s do notebook pessoal e por ai vai…

Mesmo diante de todos esses desafios técnicos, da noite para o dia, a empresa nos mandou para casa dando um notebook. Estavam dando notebook como quem entrega panfleto nas ruas para implementar o home office o quanto antes. Eu não queria estar trabalhando na TI naqueles dias, com certeza foram os piores dias dos caras. Mas eles mandaram muito bem!

Quando uma empresa que leva meses para implementar uma solução faz uma coisa assim em dias, dá para imaginar que a coisa é séria. E foi assim que entendi a dimensão do problema. Pelo menos fico feliz por estar no grupo das pessoas que foram mandados para casa com um notebook embaixo dos braços, pois tem muita gente por ai que levou um pé na bunda. Por isso, não tenho do que me queixar, mesmo tendo que trabalhar num notebook minúsculo.

Quem gostou da ideia foi a Chiquinha, a gatinha da casa. Um dia falarei mais sobre a história dela. Agora ela tem 100% de nossa atenção. Está levando uma vida de rainha.

Sempre elegante e fotogênica Chiquinha.

No início da quarentena, fui no muro buscar uns pedaços de madeira para fazer uns módulos para o muro. Guardei essas madeiras com a intenção de fazer isso num futuro qualquer, mas nunca imaginei que seria dessa forma. Os retalhos de madeira me ajudaram a passar o tempo para o desespero da Paula. Consegui passar muito tempo trabalhando neles. Foi uma boa terapia. Acho que consegui fazer uns 10 volumes em 10 dias.

Trabalhando nos volumes em casa.

Em termos de escalada, resolvi ficar as primeiras duas semanas de molho. Uma vez por ano, fico algumas semanas bem off para descansar um pouco. Afinal de contas, sou um quadragenário. Então aproveitei a oportunidade para fazer o descanso forçado na esperança de voltar a normalidade depois, #sqn. Na terceira semana notei que comecei a perder peso. Subo na balança todos os dias e tenho uma tabela de peso desde 2014 para acompanhar a evolução. Com certeza não foi por causa da alimentação, mas sim pela perda de massa. Então resolvi começar a me mexer. A essa altura, a internet estava inundada de dicas, protocolos e workout’s para quarentena. Aproveitei a oportunidade para estudar alguns protocolos novos e montar um plano de treino. Eu e todo mundo! Instalei uma barra que arrumei há uns 10 anos, mas depois de algumas sessões achei mais prudente desinstalar, porque estava querendo cair. Não é uma boa época para ir a um hospital. Também montei um hangboard a contragosto da esposa num canto da casa e comecei a fazer alguns protocolos. A maior virtude de um escalador forte são os dedos!

Na quarta semana notei que o peso continuava a baixar e a minha panturrilha estava ficando mole. Eu tinha ficado assim quando quebrei as duas pernas escalando. Acendeu uma nova luz de atenção e então comecei a colocar nos meus protocolos algumas sessões de corrida. Para evitar qualquer contato social, desde então, tenho saído de casa depois das 19h e vou correr num point secreto onde ninguém anda. Com isso, nas últimas semanas o meu peso voltou a subir um pouco.

O nosso muro de cada dia foi fechado no dia 17 de março, e assim permaneceu. A coisa foi tão abrupta que abrimos num dia e no outro, estávamos fechados. Três semanas depois, voltei para o muro para colocar os novos volumes, assim como as novas agarras que foram chegando ao longo da quarentena, o que foi muito bom para desopilar um pouco. Quando fico de saco cheio de ficar em casa, dou um pulo lá para trocar as agarras e fazer pequenas melhorias. E agora que estou vendo uma luz no fim do túnel estou pensando em marcar uns boulders para retomada.

Novos volumes no muro aguardando a volta. Essas agarras foram desenhadas exclusivamente para o Master do Chile que foi cancelado no início da pandemia.

No início, achei que fosse ter uma crise de abstinência por não sair para escalar, mas a medida que o tempo foi passando, vi que estava conseguindo levar na boa. Pensei muito sobre isso e conclui que, na verdade, eu estava precisando disso. De ficar longe da escalada por um tempo. Escalo desde 1995 praticamente todos os finais de semana e desde 1998 treino semanalmente. E a única vez que parei de escalar mesmo, foi em 2012, por 45 dias, depois que quebrei as pernas, ai não teve jeito. Então no fundo, eu estava um pouco cansado dessa rotina.

Além disso, abril é sempre um mês difícil para escalada por aqui. É aquele período em que ficamos muito ansiosos porque é pré-temporada, quando o clima ainda não está perfeito. Cansei de me meter em várias furadas ao longo dos anos nesse período. No ano retrasado, lembro que estava tão pilhado, que na pré-temporada estava à mil pelo Estado me metendo em casa roubada que quando chegou a época prime, estava estafado e não consegui aproveitar…

Pré temporada de 2018. Esperando a chuva passar numa parada qualquer em Afonso Cláudio.

Eu ainda tenho a possibilidade de escalar em solitária. Pratico esse estilo de escalada desde que comecei, mas escalar em solitária não é assim. Você não sai por ai porque estamos em isolamento social. A necessidade de sair em solitária é algo maior. Você precisa estar com a alma preparada para encarar esse tipo de escalada, porque é algo que envolve risco, comprometimento e trabalho, muito trabalho. Não adianta o meu corpo querer se a mente não estiver em sintonia e parece que nesse momento não estou disposto a borrar a minha cueca.

Eu acho que todo escalador de verdade sabe esperar o momento certo para agir. Na escalada somos constantemente testados a esperar. Esperar a melhor hora para fazer aquela investida certeira, uma viagem, uma tentativa ou até mesmo para sair de um descanso e encarar o crux. Esperar faz parte da vida do montanhista e esse período é só mais um momento desses. 

Vista do Monte Mestre Álvaro de casa com nuvens lenticulares (?) no topo.

Comentários

2 respostas em “Diário de uma pandemia – mês 1”

Só prestei atenção em uma coisa nesse texto: “quadragenário”.

De acordo com o dicionário, quadragenário significa:

adjetivo substantivo masculino
1. que ou o que contém 40 unidades.
2. que ou quem tem de 40 a 49 anos de idade.

Diante disso, podemos concluir que vc pode ter 49 anos

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